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Ricardo Braz, 25 anos, nascido e criado no Rio de Janeiro. Trabalha há dois anos integralmente como fotógrafo de viagem com foco em natureza e aventura.


Como você entrou nesse meio de fotografia de viagem e como é produzir conteúdo nas viagens - os desafios, os perrengues e qual a parte que você mais gosta? 

As viagens sempre estiveram presentes em minha vida. Desde pequeno viajei com meus pais, principalmente para os Estados Unidos, onde temos família e visitamos com certa frequência. Em 2015 fiz minha primeira viagem “sozinho” – um mochilão de um mês com dois amigos pela América do Sul (Chile, Bolívia e Peru). Nessa viagem comecei a tirar fotos com um Iphone 5 e postar no Facebook e Instagram para amigos e familiares. O retorno foi incrível e a partir daí, decidi que gostaria de comprar uma câmera para melhorar minha fotografia. Em 2016 fiz meu segundo mochilão, minha primeira ida à Ásia por dois meses. Nos primeiros dias de viagem comprei uma câmera sem saber de qualquer especificação técnica, configurações, regras de composição – basicamente não tinha ideia do que fazer com aquela câmera de entrada em minhas mãos. Foi amor à primeira vista – me apaixonei pelo ato de fotografar e comecei a buscar diversos tutoriais no Youtube para aprimorar minhas habilidades. Algumas viagens depois já comecei a construir uma rede social mais engajada e sentir que as pessoas curtiam minha fotografia. Nesse meio tempo estava fazendo faculdade de Administração e trabalhando com marketing e vendas há alguns anos, algo que curtia, porém, não era apaixonado. Me formei no final de 2017 e decidi que “largaria tudo” para viajar o mundo tentando tornar esse hobby que cada dia me envolvia mais em um trabalho. Investi em uma câmera um pouco melhor e passei cinco meses na Ásia focado em criar portfolio e em construir um Instagram legal. Nessa viagem consegui diversos trabalhos com hotéis, agências de viagens, locadoras de carro, marcas de roupa e etc., e percebi que poderia dar certo. Além disso fiz conexões incríveis no mundo da fotografia que me ajudaram a chegar aonde estou hoje. Novos trabalhos e viagens começaram a surgir e desde então, não parei de seguir esse sonho!

Pelas redes sociais parece que tudo são flores durante as viagens, mas a maioria das pessoas não sabem o trabalho de produzir conteúdo viajando. Acordar cedo para ver o nascer do sol todos os dias, carregar mochila de equipamento pesada, sacrificar horas de sono e não ter uma rotina são alguns pontos que no longo prazo te cansam muito. Para quem está na estrada com bastante frequência, viajar a trabalho pode até deixar 
de ser prazeroso e virar algo maçante, que você faz somente como uma obrigação ou que está errado como em todas as outras profissões. Para mim, o mais desafiador é conciliar a vida profissional de viagens e trabalho com o tempo em casa, com família e amigos. Não vou negar, me sinto incrível quando estou viajando e sou completamento apaixonado pelo que faço, mas já tive alguns momentos de burnout que me fizeram repensar em algumas escolhas.

Porém, os lados positivos são infinitamente maiores. Um dos meus maiores prazeres durante estas viagens é conectar com as pessoas do meio e produzir conteúdo junto em um lugar novo. Essa combinação de pessoas novas e experiências novas é com certeza a parte mais prazerosa do que faço! Além disso, ter a possibilidade de mostrar novos lugares e experiências para um grande número de pessoas e ser visto como “inspiração” não tem preço!



Qual equipamento você usa e por quê? Tem algo essencial que você usa para fotografar durante suas viagens que você não usa para fotografar no seu dia a dia?

Fotografo com uma Fujifilm XH1 uma câmera de sensor cropado, porém incrível. Como disse acima, ao comprar minha primeira câmera não tinha nenhum conhecimento de especificações técnicas e acabei escolhendo uma Fuji XT-10, mais pelo visual, tamanho e peso. Comecei a construir meu kit Fuji desde então e fui evoluindo dentro dele com câmeras e lentes melhores e mais profissionais. Talvez hoje com todo meu conhecimento não começaria com uma Fuji e provavelmente fotografaria com uma Sony, mas ela ainda é boa suficiente para o que faço e não senti necessidade de trocá-la.

Hoje em dia viajo com basicamente 4 lentes: uma aberta (16-35 f4), uma padrão (24-70 f2.8), uma tele (85-300 f3.6 – 4.5) e uma fixa aberta e rápida (18 f2). Sinto que meu kit é completo e raramente me falta algo. Acho essencial para um fotógrafo de natureza poder ter diferentes distâncias focais para variar seu estilo de fotografia – a mesma paisagem pode ser totalmente diferente se fotografada com uma 16mm e uma 300mm. Para algumas viagens dependendo do conteúdo que quero produzir levo uma lente de retrato (35 f1.4) e uma tele com mais alcance (150-600 f4.5-5.6).

Além disso, utilizo bastante meu drone (Mavic Pro 2), uma grande adição para o kit!



Acredito que a inspiração vem de muitos lugares hoje em dia, mas minha principal fonte é com certeza o próprio Instagram. Sigo diversos fotógrafos de viagem com trabalhos parecido com o meu e que me inspiram todo dia, e já tive o prazer de estar junto e fotografar com alguns deles. Outra grande inspiração para mim é o Wes Anderson que vem da inspiração do cinema.


Qual dos seus destinos foi o mais difícil de fotografar? E o mais prazeroso?

Para mim, os destinos mais difíceis de fotografar são aqueles que requerem uma grande atividade física. Geralmente trilhas onde é preciso carregar mochila, equipamento, comida e etc. para diversos dias são muito desgastantes e acabam que o foco na fotografia se perde um pouco. Foi o caso quando fiz a trilha do Base Camp do Everest, no Nepal. Apesar de ser um dos lugares mais lindos que já estive, não consegui criar o conteúdo que queria por estar focado mais na trilha e na experiência do que nas fotos em si – o que também é válido e super saudável!

Quanto ao destino mais prazeroso é difícil escolher somente um, então vou dizer dois. Apesar de completamente diferentes e únicos, a Islândia e a Indonésia estão no topo da lista de países que gostei de viajar e fotografar por serem extremamente diversos e fotogênicos. Já visitei os dois duas vezes e não vejo a hora de visitá-los de novo!



Qual a maior lição que você leva depois de ter explorado tantos países com culturas, climas e rotinas tão diferentes uma das outras?

A maior lição que levo das minhas experiências de viagem é além de respeitar sempre o outro, independente de raça, status, nacionalidade e aparência, é ter sempre a cabeça aberta para novas amizades e experiências. A quantidade de pessoas incríveis que tive o prazer de conhecer ao longo dos últimos anos e que provavelmente nunca teria contato na minha cidade é enorme. Cada viagem/destino é um novo aprendizado e se você estiver disposto a aprender, sair da sua própria bolha e da zona de conforto, apesar de soar bem cliché é essencial para viver o lugar em sua essência, se conectar consigo mesmo e com os outros e descobrir não só lugares, mas sentimentos novos dentro de você mesmo.


Tem algum sonho ainda não realizado na sua área? E algum objetivo já alcançado?

Meus dois maiores sonhos/objetivos na fotografia são: 1. Trabalhar em um grande projeto que possa ajudar o mundo de alguma maneira – como por exemplo, documentar a retração de uma geleira devido ao aquecimento global, ver uma espécie de animal à beira de extinção ou uma tribo nômade que foi atingida pelo crescimento dos centros urbanos. E em segundo lugar, ensinar pessoas através de workshops presenciais pelo mundo.

Um objetivo alcançado que acredito que seja um objetivo de todos os fotógrafos do mundo, apesar de nunca pensarmos que seja possível, foi ter uma foto publicada pela Nat Geo. Uma foto minha no mar morto, em Israel, foi publicada como um spread em página dupla na revista global de julho de 2019, certamente o marco mais importante da minha carreira!

                 
Por último, pedimos para o  Ricardo nos contar uma história interessante sobre alguma viagem... ele nos contou duas! Se liga.

A primeira é positiva / feliz. 

Cheguei sozinho no Cazaquistão, um país que apesar de desconhecido para muitos, é incrivelmente seguro e tranquilo de se viajar. Decidi alugar um carro e rodar sem destino por 7 dias, já que os lugares que queria fotografar eram impossíveis de chegar com transporte público e meu tempo era limitado. Meu primeiro destino era o parque nacional de Altyn Emel, onde ficam as montanhas Aktau e as “Singing Dunes”, lugares que estavam em minha lista de viagem por bastante tempo. Esse parque não é muito visitado e existe pouquíssima informação disponível na internet. Depois de quatro horas de estrada cheguei na entrada do parque, um pequeno vilarejo que parecia uma cidade fantasma. Comecei a procurar um hotel para passar a noite e sem internet e ninguém na rua, não achei nada. Tinham dois meninos com uns 8 anos jogando futebol no meio da rua e eu parei para conversar com eles. Um deles tinha o inglês extremamente básico e o outro não falava nada. No começo não falamos nada, somente parei o carro perto e joguei um pouco de futebol com eles. Depois, com auxílio do Google Translator baixado com Russo e Kazak, perguntei se eles conheciam algum lugar que eu poderia comer e passar a noite, além de, alguém me levasse até as dunas para ver o pôr do sol. Acontece que a família de um dos meninos tinha uma guesthouse ali perto que poderia me receber, me dar jantar e eles mesmos poderiam me mostrar o caminho das dunas. Então, fomos então no meu carro eu e os dois meninos, por uma hora adentro do parque ouvindo rap russo no volume máximo e vidros abertos como se fossemos melhores amigos há anos já. Chegando lá, pegamos condições incríveis de luz com uma tempestade a caminho e o sol baixo no horizonte. Eles viraram meus modelos e tivemos uma tarde perfeita. Na volta, fui convidado para jantar com toda a família dele em sua casa – ninguém falava inglês, mas não foi necessário para trocarmos sorrisos e risadas. Eles também me ofereceram um quarto sem que eu tivesse que pagar nada, mas obviamente paguei. No final da noite dei ao menino uma camisa do Brasil que sempre levo comigo em viagens e guardo para oportunidades como essas para dar àqueles que merecem – nunca vi um sorriso tão largo na minha vida! O menino ficou bobo de tão feliz e a mãe caiu em lágrimas. No dia seguinte, quando vi o menino indo para a escola com aquela camisa tive certeza que foi uma das experiências mais incríveis que já tive em viagem!



A segunda é meio bizarra...

O começo dessa mesma viagem foi no Turcomenistão, um país que a grande maioria do mundo nem sabe que existe. É a segunda pior ditadura do mundo depois da Coreia do Norte. Na minha chegada no país tive que subornar um policial para entrar porque aparentemente meu nome no passaporte estava errado (obviamente não estava) e troquei dinheiro no mercado negro com o guia (o dólar vale no mercado oficial 3,5 moedas locais e no mercado negro é possível trocar por 15!). Estávamos em grupo, é obrigatório estar em um e ter um guia te acompanhando durante toda a estadia no país. Viajamos em um caminhão de lixo adaptado para longas viagens e fomos acampando pelo país, um modelo de viagem chamado de “Overland” travel. Passamos dois dias na capital Ashgabat, conhecida por recordes mundiais bizarros. O presidente (leia-se, ditador) do país é aficionado por mostrar riqueza – o país é bastante rico devido às reservas de gás natural – e, por isso, decide bater todos os recordes mais esquisitos do mundo para mostrar que é o “melhor”, como por exemplo: a maior concentração de prédios de mármore branco, o maior número de postes de luz e fontes em uma avenida, a maior roda gigante indoor, a maior construção de uma estrela de 8 pontas, a maior torre de TV, entre outras. Vale a pena procurar na internet a lista completa! Depois desses dois dias explorando a capital e explorando essa cidade bizarra, embarcamos no caminhão para continuar nossa viagem que tinha rumo ao Uzbequistão. A jornada teria duração de quatro dias, um deles na famosa “Door to Hell”, até chegarmos na próxima cidade - já que no outro país, e atravessaríamos um dos desertos mais quentes e inóspitos do mundo fazendo “bush camping” – acampar sem nenhuma estrutura de banheiro, hotel, restaurante, eletricidade e etc. Pegamos uma onda de calor surreal onde durante o dia faziam 45ºC e a noite 35ºC. O caminhão não tinha ar condicionado ou geladeira. No segundo dia nessa jornada o grupo já estava totalmente exaurido do calor absurdo, falta de alimentos frescos e água gelada. Ninguém se aguentava em pé e a viagem estava se tornando desagradável. Na terceira noite montamos acampamento perto de um forte/castelo incrível, importantíssimo, na famosa Rota da Seda há séculos atrás. Nessa noite o grupo resolver cozinhar um estrogonofe de carne para o jantar. Como a carne não estava devidamente resfriada, acreditamos que estava estragada, e 30 minutos depois todo o grupo estava com dor de barriga e diarreia (exceto eu e uma outra menina que somos vegetarianos). Além disso, a comida quente não combinava com o calor de 35ºC a noite e a única e pouca água que tínhamos estava quente, ou seja, foi um verdadeiro caos. Para piorar a situação, esse lugar era cheio de insetos e até bichos perigosos como escorpiões e cobras, então fomos obrigados a dormir dentro da barraca sem poder deixar nem uma fresta aberta (nesse ponto já não sabíamos se era mais quente dentro ou fora, para ser sincero). Obviamente ninguém conseguiu dormiu essa noite. Na manhã seguinte todos estavam derrotados no café da manhã, até que uma holandesa que estava com a gente desmaiou de tão fraca que estava. Prestamos socorro rápido a ela e, por nossa sorte, tinham pessoas mais experientes que souberam como agir no calor do momento. Estávamos a mais ou menos oito horas da próxima cidade, porém, só chegaríamos no dia seguinte seguindo o roteiro original. A guia, então, decidiu cortar um dia de viagem e dirigimos até a cidade de Khiva, onde levamos a holandesa ao hospital público da cidade – eu não queria ser ela naquele momento. Essa foi sem dúvidas uma das piores experiências de viagem que já tive!